Frágeis Flores

Não chorou; sua alma era das que não têm lágrimas, enquanto lhe restam forças.

Interlúdio V

Mesmo aparentemente feliz, para mim, que podia ver o que realmente se passava em seu coração, estava claro que não era assim que ela se sentia. Eu podia ver quanta tristeza e solidão ela carregava por trás daquele sorriso capaz de amolecer o mais duro dos corações. Senti pena, não... Pena não é a palavra certa... Eu apenas entendia o porquê de mesmo com todo o sofrimento ela era capaz de sorrir, ela sorria por seus amigos, para que eles não se preocupassem com algo que mesmo que quisessem, não poderiam mudar. Mas isso não explicava a felicidade crescente que eu sentia. Não só entender, mas compartilhar de sentimentos iguais, meu coração estivesse ansiando por alguém capaz de entender suas dores, alguém que pudesse curá-lo e ser curado por ele. A minha perdição veio no momento em que compreendi tudo isso.

Eu já não conseguia tirar Camila dos meus pensamentos, nem todo o sangue do mundo poderia desviar minha mente dela nem que por um instante apenas. Pensava em tomá-la para mim, levando-a para casa comigo, transformando-a em um monstro como eu, companheira perfeita para toda eternidade. Eu precisava descobrir um jeito de me aproximar dela, não como o vampiro imortal, mas como alguém capaz de ajudá-la a curar seu coração. Planos e mais planos foram feitos e descartados, quando não conseguia vê-la em seus passeios, entrava em sua casa para velar-lhe o sono. Apenas quando adormecida, mostravam-se em seu rosto os sinais do que realmente sentia. Quantas vezes durante essas vigílias a alvura de seu pescoço e o cheiro de seu sangue quase não me fizeram perder a cabeça?

A chance de me apresentar a ela veio de uma forma inesperada em uma das minhas inúmeras visitas ao bar próximo ao hotel. Era um dia de festa na cidade, todos saiam de casa com suas melhores roupas tentando causar a melhor impressão possível, eu trajando o jeans de sempre estava sentado pensando em Camila enquanto “olhava sem ver” as pessoas passando por mim. E assim, sem que eu me desse conta, fui inserido em uma conversa e bombardeado com perguntas do tipo: “De onde você veio?”, “Porque logo Boa Esperança?”, etc... Respondi da melhor maneira possível, com alguma história de como havia acabado a faculdade e estava fazendo uma viagem pelo Brasil sem previsão de retorno. No meio de meus “inquisidores” estava um dos amigos de Camila, dei uma atenção especial a ele e no final da noite éramos velhos amigos. Ele me convidou para uma festinha que se realizaria no dia seguinte dizendo que seria interessante e que haveria algumas mulheres bonitas por lá, respondi prontamente que sim, dizendo que estaria lá assim que resolvesse alguns problemas menores a respeito da viagem com minha família.

Passei o resto da noite em meu quarto pensando o que faria, diria e como agiria na presença da pessoa já tão preciosa para meu coração. Uma coisa era certa, eu precisava me alimentar, e bem, antes de me dirigir a essa festa. Um pouco do Dom da Nuvem e logo estava me alimentando bem longe da cidadezinha pacata, sem tempo a perder escondi meus restos de qualquer forma, embriagado com o sangue que acabara de beber e com a ansiedade do encontro que estava por vir. Cheguei em casa quase ao amanhecer, enfiei-me em baixo das cobertas avisando na recepção para que ninguém me perturbasse o dia todo, apesar de querer muito sair e gastar minha ansiedade por aí, ficava como que morto enquanto o sol se mostrasse.

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