Frágeis Flores

Não chorou; sua alma era das que não têm lágrimas, enquanto lhe restam forças.

XXIII

Cansei de ser, ser implica ser algo e no momento não quero ser ninguém, nada de nomes rótulos ou adjetivos.

Quero viver na não-existência, ser e não ser, tudo ao mesmo tempo, palavras sentimentos e ações.

Tão leve quanto a brisa e tão poderoso como um vulcão, tão frágil quanto a mais fina porcelana e tão resistente quando o mais duro diamante.

Ser ou não ser, a questão que assombrou até mesmo Shakespeare e continua assombrando a todos mesmo hoje.

Cansei de ser e também de não ser, quero vida, quero viver.

XXII

“Vamos, diga logo o que está te incomodando” disse o garoto com os cachos dourados.

“O que você quer dizer com ‘me incomodando’?” respondeu a garota dos cabelos negros.

“Nada, é só que você nunca diz nada mesmo” pensou o garoto. “Bobagem minha” ele disse a ela enquanto passada um braço sobre os ombros da garota que com um sorriso deu-lhe um beijo suave em seus lábios e se aconchegou junto ao seu peito.

Ele sabia que por mais que insistisse ela nunca lhe diria nada, ou melhor, diria com um sorriso que estava tudo bem, mas sem nunca conseguir esconder a tristeza que insistia em se mostrar em seus olhos.

“Um dia” ele disse, “não haverá mais razões para tristeza”. E a abraçou bem apertado, como se tentasse dizer com o seu corpo que ali, pelo menos naquele momento, ela não precisava mais ter medo, pois não estava sozinha.

Ela por outro lado, aconchegada como estava, ouvia o ritmo calmante do coração do garoto e não conseguiu deixar de pensar que logo chegaria a hora de partir. “Eu queria te contar tudo, de verdade” ela pensou, “mas você nunca entenderia, ninguém nunca entende. Se eu ficar, eles logo estarão aqui e irão machucar todos ao meu redor... E eu simplesmente não agüentaria ver isso acontecer novamente.”

E assim abraçados, o garoto dos cachos dourados e a garota dos cabelos negros assistiram ao pôr-do-sol de um lugar privilegiado à beira do lago, sem nunca saber o que o outro está pensando, mas entendendo o que o outro sente daquela forma especial que não precisa de palavras para acontecer. Ambos concordando que os breves momentos de felicidade, por mais fugazes que fossem, devem ser aproveitados ao máximo, afinal de contas isso é a vida real e não um conto de fadas qualquer.
P.S.: Ah, e hoje é meu aniversário.

XXI

Falta

Sinto falta do seu sorriso que nunca vi,
do seu cheiro que nunca senti,
do seu toque que nunca conheci.

Sinto falta dos passeios que nunca damos,
das juras de amor que nunca trocamos,
das noites de amor que nunca tivemos.

Sinto falta das brigas que nunca tivemos,
das pazes que nunca fizemos,
das tristezas e alegrias que não compartilhamos.

Sinto tanto a tua falta mesmo sem nunca ter te conhecido,
talvez não passasses de um sonho, sem nunca ter realmente existido.

XX

Voltei, apesar de nunca ter partido. Cheio de resoluções vazias para esse ano que começa. Desejos e esperanças, mas nenhum sonho, os meus se foram todos. Para onde vão os sonhos mortos?

Penso que assim como os elefantes, os sonhos sabem quando estão perto do fim, consigo imaginar sua caminhada pelo deserto da não-existência rumo ao grande cemitério dos sonhos.

Como seria esse cemitério? Assustador como o cemitério de elefantes que vemos em “Rei Leão” (1994)? Ou encantador como um grande jardim selvagem?
Mas, será que os sonhos podem mesmo morrer? Ou ficam nesse grande cemitério apenas esperando um novo portador, acreditando com todas as suas forças que esse será capaz de realizá-los.

Eu gostaria de visitar esse lugar um dia, quem sabe encontrar meus velhos sonhos e saber como eles estão, ou ainda encontrar novos sonhos para perseguir...